terça-feira, 12 de março de 2013

O humanismo grego

Posted by Hijikata Toshizou on 11:51 with 1 comment


No século V a.C., as principais figuras da Filosofia – incluindo os sofistas, Sócrates e Platão – estavam ligadas a Atenas. Com o desenvolvimento da democracia, do comércio e do poder militar, a cidade tornou-se um dos centros do mundo grego. A atividade intelectual que se iniciara nas colônias gregas da Jônia e nas cidades do sul da Itália aos poucos migrou para Atenas. Entre os anos de 490 a.C. e 431 a.C., a cidade viveu um grande desenvolvimento cultural, político, econômico e de expansão comercial.
Após a vitória ateniense sobre os exércitos do imperador persa Dário, no ano de 490 a.C., e as sucessivas derrotas dos persas para os gregos, a cidade tornou-se poderosa e respeitada. Somente em 431 a.C., com a guerra contra Esparta, Atenas começa e perder a posição de liderança no mundo grego. A batalha entre as duas cidades ficou conhecida como a Guerra do Peloponeso – narrada pelo historiador Tucídides – e terminou em 404 a.C., com a derrota de Atenas. No entanto, como centro cultural, a cidade não perdeu a sua força.
Atenas passou por um momento promissor de grande expansão comercial e de enriquecimento das classes mais populares, como os comerciantes e os artesãos. Com isso, a velha classe aristocrática, formada pelas famílias tradicionais dos senhores de terra, perdeu força econômica e, conseqüentemente, força política, cedendo espaço para os comerciantes, que se tornavam a classe  mais rica e poderosa. O contexto político sofreu mudanças radicais, pois a democracia ateniense foi resultado da força e da reivindicação da nova classe por participação política. Dois grandes estadistas contribuíram para o desenvolvimento de Atenas e para implantar e solidificar a democracia, dando mais poderes aos cidadãos: Clístenes e Péricles.
A vida democrática permitiu aos cidadãos participarem da vida política e serem iguais perante a lei. Os cidadãos que queriam chegar ao poder político tinham o direito de apresentar, discutir e defender suas idéias em público. Para isso, tinham de ter grande habilidade com as palavras e saber discursar para convencer os ouvintes. Nesse contexto, o principal ideal dos jovens atenienses era o de se tornar um virtuoso político, um bom cidadão, participativo da vida cívica. A educação ateniense começou a visar a formação do sujeito que sabia articular bem as palavras, usando a retórica.
Por causa da importância dada a educação, Atenas atraiu pensadores e professores que levavam para a cidade novas idéias e modelos culturais. Chegaram sábios como Anaxágoras, continuador da escola jônica e professor de Péricles, bem como os sofistas, que serão tratados logo adiante. Protágoras, por exemplo, vinha da Jônia, enquanto Górgias era do sul da Itália.
A especulação da filosofia naturalista iniciada na Jônia e nas ilhas do sul da Itália começou, porém, a dar sinais de esgotamento, pois os filósofos se contradiziam. Inúmeras teses haviam surgido sobre a natureza e o cosmo, e cada uma apresentava resultados diferentes e contraditórios. Nesse sentido, a pólis ateniense e sua democracia tornaram-se um solo fértil para o florescimento de uma nova Filosofia, na qual a problemática a respeito da natureza era secundaria. O mais importante, nesse novo contexto, era que o conhecimento contribuísse para a vida democrática da pólis. O centro da reflexão passou, então, a ser o homem e o universo humano.
Essas novas condições sociais, culturais, políticas e históricas fizeram aparecer no cenário grego os sofistas, considerados os primeiros filósofos do período humanista. Eles censuravam os filósofos naturalistas, pois julgavam que estes pensavam ter chegado a verdade máxima sobre a natureza e o Universo, mas, de fato, o que eles faziam era apenas expor opiniões contraditórias e nada conclusivas. Para os sofistas, as disputas entre os próprios naturalistas e as contradições que apresentavam eram fatores que apenas demonstravam que o pensamento é mutável e é somente um sistema de opiniões individuais. Assim, esses filósofos caminharam para uma forma de relativismo e de ceticismo em que não se buscava a verdade – pois a verdade para eles era temporária e insegura – sendo o seu único objetivo ensinar a retórica. Tornaram-se figuras fundamentais no cenário da pólis, já que ensinavam aos jovens ricos a arte da persuasão, de articular bem as palavras, o que era fundamental para a democracia de Atenas. Eles faziam do ensino uma profissão, recebendo bons salários de uma elite que queria chegar à direção do Estado.
Sócrates era ateniense de nascimento. Sua figura teve um papel fundamental nos novos rumos tomado pela Filosofia. Ele deu continuidade ao humanismo dos sofistas, mas discordou deles em muitos pontos, trilhando outros caminhos. Sócrates não aceitava que os sofistas fossem filósofos, pois eles não estavam em busca da sabedoria. Ao contrário deles, o seu objetivo era auxiliar seus discípulos a partir da verdade e a virtude moral. Era na alma humana que estaria o saber e a virtude. Para Sócrates, a alma é onde habita a razão e os valores morais; o ser humano tem por dever se autoconhecer voltando-se para sua alma. O filósofo é aquele que convida o seu interlocutor a examinar a si mesmo, a tomar consciência e posse daquilo que possui de mais essencial dentro de si. Sócrates propõe aos atenienses que não se importem com o poder político, com a persuasão a qualquer custo muito menos com a riqueza e a fama advindas desse poder, mas sim com a verdade e com os cuidados da alma. A Filosofia seria, assim, a busca da verdade e da virtude, e somente nesse caminho os seres humanos chegariam à felicidade. Ele acreditava na capacidade da razão de levar o ser humano a tal empreendimento.
O cuidado de si, porém, estava entrelaçado ao cuidado da cidade e dos outros, exaltando-se a participação na comunidade política. Sócrates discordava da ambição pelo poder, mas considerava o exercício da virtude como um ato também político. Podemos dizer que ele esteve vinculado ao seu mundo, porém, ao mesmo tempo o transcendeu, criticando duramente os costumes, os valores e a cultura de sua época.
A filosofia de Platão, principal discípulo de Sócrates, deve seu conteúdo, acima de tudo, ao seu mestre, que foi também sua fonte máxima de inspiração. Com foco na ética, na política e na teoria do conhecimento, Platão construiu uma filosofia metafísica, na qual procurou resolver várias das questões que a Filosofia grega vinha se propondo até então: por exemplo, na disputa entre o ser e o devir, ele resolver que o ser está no mundo das idéias, que é a essência da realidade, e o devir está no mundo dos fenômenos.
No confronto entre a virtude e a vida política, Platão afirmou como Sócrates, a ética individual baseada na consciência e radicada na alma. Mas, ao mesmo tempo, propôs a ética na organização de uma sociedade política mais justa, na sua utópica A República. Ou seja, para Platão, assim como para Aristóteles, não poderia haver política sem ética, assim como a ética – prática da justiça e das virtudes sociais – tinha um caráter político.
Dessa maneira, inaugura-se no Ocidente a visão idealista do mundo e da existência, considerando a alma como portadora de imortalidade, de moralidade e de conhecimentos. A educação verdadeira, nesse contexto, seria aquela que abre o olho da alma, pelo cultivo da razão, para a visão da verdade e para a conseqüente prática da virtude.
Não é possível esquecer as chamadas escolas filosóficas dos socráticos menores, que também devem esse nome a fundamental influência de Sócrates: Antístenes e Diógenes, da escola cínica; Aristipo, da escola cirenaica; e Euclides, da escola megárica.
A escola cínica levou ao extremo a proposta de felicidade proporcionada pela virtude, em oposição aos prazeres sensoriais, tendo Antístenes e, depois, seu discípulo Diógenes, levado uma vida de ascetismo. Ambos preferiam viver na nobreza e na necessidade a se corromperem com os costumes da época. Já Aristipo de Cirene, fundador da escola cirenaica, herdou de Sócrates a idéia de autodomínio como fonte de felicidade. Ele teve também influência dos sofistas, na medida em que afirmava que todo o nosso conhecimento é subjetivo, ou seja, pode-se afirmar que tal ou qual coisa provoca em nós uma sensação, sem se saber de fato o que é.
A escola megárica, fundada por Euclides de Megara, é a que mais se aproxima de Platão, pois considera que existe um Ser Uno, o Bem, que constitui a essência de todas as coisas. O conhecimento desse Bem é a virtude, e a virtude é o conhecimento.

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